Ninguém me entende – dizia a voz adolescente e revoltada vez ou outra a me incomodar. Esse sentimento de incompreensão visitou-me tantas vezes que já passeia confortável nas incursões pelas minhas angústias. Já é parte do lugar por convivência pacífica. Tornou-se um refúgio plausível e justificativa tranquila para a solidão a qual me acostumei.
Confesso gostar, inclusive, de estar nessa posição de segredo do mundo. “Um mistério pela noite a vagar: sou o sonho da tua esperança, tua febre que nunca descansa, o delírio que te há de matar” era a minha descrição no falecido Orkut copiada dos versos do falecido Álvares.
Essa queixa, a de não ser entendido por ninguém, já não me cabe desde que você se/me revelou. Talvez não sejamos almas gêmeas, mas extensão de uma mesma alma, de uma mesma rebeldia inocente, porque você me escreve de dentro.
Você me soube como nenhum boêmio ou terapeuta foi capaz; desembaralhou minha sorte nas suas cartas; cravou precisões indefensáveis nas tuas linhas.
Ninguém me entende – e isso parecia assustador até o surgimento de alguém que me entende por completo, mesmo com minhas pistas diluídas em oceanos de introversão, com minha esquiva experiente. Isso sim é assustador.
Não sei o que somos. Parceiros na missão de sentir mais que os outros sentem; amor tão platônico quanto covarde- não da sua parte; amizade colorida com os desbotamentos de quem fomos quando nos encontramos a primeira vez; hospedeiros de afetos indefinidos que tomam forma, gosto e temperatura quando nos encontramos novamente; pedaços da alma fragmentada que sinaliza pulso ao encontrar um semelhante.
Talvez fossemos uma pessoa na encarnação passada que, cansada de carregar só o peso das tormentas, dividiu-se em mais corações para suportar. Pertence somente a nós esse (des)entendimento; mas há uma conclusão irrefutável: com você, eu já não sou mais tão sozinho.
Eu sou essa fuga e o rastro fantasioso que deixo para trás. E você já se deu conta de que não adianta perseguir o rastro tentando me alcançar, porque eu não existo para além dessa perseguição…
Se, para mim, eu sou sempre esse quase, esse tiro de raspão; você me afia na falha, no corte da navalha cega, determinada em fazer o sangue correr. Yeah, you bleed just to know you’re alive.