A nós

16h32 de um sábado, meio de mês de primavera, céu de inverno.

Olho da janela as nuvens cinza pendendo sobre a cidade fria. Música italiana, porque é preciso ter um quê de impossibilidade de tradução refletindo a irrepresentabilidade das nuvens dentro de mim.

Da caneca, sobe a fumaça do seu chá embaçando meus óculos. A opacidade da visão desanuvia meus pensamentos.

Indomáveis, vão sugerindo formas. Mãos hesitantes alternam-se com mãos de propriedade. Lábios presos de falsas grades alternam-se com as pupilas dilatadas de entrega. E a busca e os murmúrios inconscientes da madrugada. Formas de cumulonimbus, as nuvens de tempestade.

Todas se desfazem rápido, mas o céu continua fechado.

Olho a hora no celular. Hábito de me afirmar pela rapidez com que consigo retalhar a minha alma na tessitura do idioma que se domina.

Mensagem sua, veja só. Sorrio.

Dizem que quando o pensamento é forte, profundo, ele é capaz de conjurar realidades.

Então vem cá, senta comigo embaixo dessas cobertas, faltaram minhas mãos ao redor das suas pra eu te envolver e te aquecer nos meus laços.

Carolina Palha

Editora, mestre em psicanálise das perversões sexuais e afeita à bagaceira. Nunca soube escolher entre praia, dança e Coca-Cola.

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