A frase, por menor que seja ela, só pode receber o sentido assim que se termina, pois guarda em seu final o potencial de direcionar a sentença por diferentes caminhos: determinantes afirmações, auspiciosos questionamentos, expressivas exclamações ou reticentes ironias…
A última frase de um parágrafo comparece para reafirmar ou invalidar o discurso até ali edificado. O poder não só de se manter a trama ou descontinuá-la em novas potencialidades, mas de ressignificar tudo o que foi escrito anteriormente, desmoronando para reconstruir. Cada ponto final condiciona a compreensão do que lhe antecede.
Então, a última palavra da última frase do último parágrafo do último capítulo de um livro carrega em si a responsabilidade sobre a decisão definitiva da história por completo; e vem como consagração de todas as palavra que criaram os pormenores do enredo, compuseram os detalhes dos cenários, deram as particularidades dos sotaques dos diálogos, figuraram a matéria e metáforas dos sonhos e pensamentos dos personagens até aquele derradeiro momento, o final; o fechamento de um ciclo em si.
Como se a última peça do quebra-cabeça pudesse alterar toda a imagem que se vinha descobrindo até então; é no desfecho que recai a significação real do todo passado. A releitura precisa do fim e os fins modificam os meios – como linhas temporais simultâneas; o passado, presente e futuro coexistindo e influenciando-se paralelamente. E, não sendo capazes desse entendimento interdimensional, limitamo-nos a não conhecer verdadeiramente alguém nos começos dos ciclos, mas, tão logo, ao se fecharem.
As palavras e atitudes do capítulo final conseguem alterar inteiramente a vivência antecedente – a revelação sobre as palavras já escritas… de leitura mutável, porém. O encerramento que não é encerramento, mas possibilidade de criar uma narrativa com a visão da totalidade outrora inexistente. Reescrever o passado é impossível; a releitura, obrigação. E, na revelação, há libertação.
Ao terminar e fechar o livro, respira-se e aquele silêncio estranho se prolonga – e deve-se deixar prolongar. É nessa sensação de vazio que ecoa a assimilação do gosto que fica do que acabou de se passar: seja gratidão, amargura, inquietação ou alívio tardio. É preciso deixar ecoar antes de começar um outro livro. Olhar para a capa, guardá-lo na estante ou passá-lo adiante. E, na releitura do infortúnio de um romance inventado, ao menos, reconheci que não posso sofrer a perda e carregar a saudade de alguém que nem mesmo conheci…