Ritornello

Seus olhos de pentatônica facilmente me improvisam
E, como síncope, acordam do meu corpo tempos improváveis
Desnudam de mim os intervalos e os impropérios
De urgentes desejos e necessidades improrrogáveis
E marcam compassos, que, não fossem seus, seriam impróprios

A consonância que verte em arrepio minhas pernas
Torna axilas e cotovelos hereges sustenidos
De gemidos tocados em antigos pianos de tavernas
Em escala cromática que de imprecisas comas me governa
Pelo maestro que de precisos movimentos me rege

Se trago ombros de escala menor e passadas tardias
Meus quadris, quando te envolvem, viram samba funkeado
E, de quinta desajustada, a escala maior que irradia
Arma a clave conforme a música se escreve leve e vadia
Livre, como nossas mãos e pernas confusas em legato

Sua boca de acordes dissonantes meus pelos revolta
E, no groove sincopado que recorda, pedem pra você ficar
Quando minha nuca de solfejos e malabarismos é ribalta
Fusas são breves, pedindo pra parar, seguir, continuar
E de onde não se espera todo o virtuosismo faz escolta

Arrebenta como cordas que excedem a afinação minha calcinha
E vem com forró em distorção, vem com barroco em improvisação
Se os solos de guitarra forem seus, aquela música não é minha
E com seus dedos transcende minha pele e minha cama
E distorce também minha mente, e toca também minha chama

Carolina Palha

Editora, mestre em psicanálise das perversões sexuais e afeita à bagaceira. Nunca soube escolher entre praia, dança e Coca-Cola.

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Seja um dia, seja uma noite, as coisas ficam claras. E elas simplesmente não importam mais. Eu não sei mais o que você está sentindo.
Se me perguntarem qual amiga que sou, vou responder que sou a amiga que fica. Aquela amiga que segue a vida, mas sempre encontra um tempo.