Ela sumiu. Sem conversas, sem fotos. É como se não tivesse existido, mas sei que foi real. Dentro de mim, foi real.
Ela simplesmente sumiu. Não há emojis, gifs fofinhos, piadas ácidas, mensagens de bem querer.
Sumiu assim, do nada. Não tive tempo para contar como foi meu dia. Ou falar dos presentes que pensei em comprar, das surpresas que pensei em propor. Era um dia comum, estávamos online, eu achava bom. Fazia um frio aqui em São Paulo.
Vesti o primeiro moletom que encontrei, puxei meu cobertor até a altura dos ombros e esperei. Parecia um casulo, só rosto e pés de fora.
Nas primeiras semanas, pensei que fosse o cansaço. Falta de assunto, talvez. Como ter assunto com tanta coisa não acontecendo?
Nas semanas seguintes, minha memória foi colapsando, uma neblina só. Como se o frio que sentia fora do cobertor tentasse me encontrar, invadindo minha cabeça por alguma fissura entre os fios desgrenhados. Um mundo em tons de cinza.
É difícil admitir. Mas ela sumiu. Levou junto nossas lembranças.
A história da perspectiva de quem fica, do elo esquecido, é tão triste. Ninguém quer ser o lado b, a segunda opção.
Leva tempo para sarar. Tempo para sair debaixo do cobertor.
A primeira encarada no espelho é difícil. Vejo que o moletom gasto, manchado. Moletom este que era seu. Mas que herdei por usucapião.
Aos poucos te encontro nos mínimos detalhes, na xícara quebrada do café da manhã, no chinelo perdido pelo corredor, nos vídeos sugeridos, na playlist de músicas mais ouvidas.
Gradualmente, percebo que de quem me esqueci.
A figura que me encara no espelho.
Por todo esse tempo, senti minha falta. Quem sumiu fui eu, mesmo estando sempre aqui.
Eu, que estive me procurando.
Tiro o moletom puído. Um banho quente cai bem.