Devo começar o texto com uma alerta: já em seus primeiros minutos, o filme aborda temas sensíveis, com gatilhos emocionais fortes para algumas pessoas. Mesmo sendo arte, tendo suas licenças poéticas bem definidas, talvez seja importante escolher o momento certo para assisti-lo. E claro, confira sempre a classificação etária.
Midssomar, o novo filme do Ari Aster (também conhecido pelo excelente “Hereditário”), mostra que ele não veio para brincar. Cheio de referências e simbologias, o filme é um deleite visual, feito com esmero. Uma fusão de ângulos, cores, movimentos de câmera pra deixar qualquer amante da sétima arte em êxtase. Tudo possui um propósito bem colocado e sobre isso iremos conversar aqui. Nada de spoiler, eu garanto a você. Vamos falar sobre alguns aspectos visuais e possíveis detalhes que ajudarão na compreensão da película.
O primeiro ponto importante de analisar aqui é o seu gênero, ou a forma como o filme foi vendido. Produzido pela A24 – que tem em seu catálogo muitos filmes fora da caixinha e bastante premiados – Midsommar pode ser interpretado como um terror, mas não somente. Existe muita tensão ao redor da trama com uma mistura dramática que não foge do realismo. Logo no início do filme, vemos Dani e Christian – um casal em crise num relacionamento fadado ao fracasso. Do lado dela, mesmo notando todo o distanciamento do namorado, há o temor pelo rompimento, ao ver nele um único refúgio emocional. Já do outro lado, há o desinteresse por parte de Christian, mas terminar seria uma responsabilidade muito grande, um peso que ele não é capaz de lidar.
Alguns desavisados podem ir ao cinema esperando um filme com muitos sustos, os famosos jump scares. Essa não é a proposta da produção, bom salientar. O subtítulo “O mal não espera a noite” também não ajuda muito. Midsommar não se propõe a definir o bem e o mal, esse antagonismo não existe durante o filme. É mais uma jornada de redenção, uma metáfora para o luto.
Para quem não sabe, Midsommar, em tradução livre, seria algo como solstício de verão. Um período de grande escuridão que antecede a chegada da nova estação, tempo de se preparar para boas colheitas. É costume antigo, em países do hemisfério norte, que ocorram celebrações voltadas à prosperidade. Mas, aqui, o filme cria uma comunidade diferente do que estamos habituados.
Eu aconselho que a experiência de assistir ao filme seja feita individualmente. Haverá momentos sugestivos: alguns poderão achar graça e alívios cômicos onde, no meu ponto de vista, não existem. Se tem algo que ninguém merece é ter sua imersão prejudicada pela plateia. Importante também escolher um lugar confortável: são mais de duas horas de película (sem falar na versão do diretor, com maior duração).
Podemos dizer que o filme é bastante didático: tudo está aos olhos, basta interpretar os sinais. Elementos que antecedem situações dramáticas estão presentes desde o início, em quadros, estampas, gravuras nas paredes… Mesmo assim, nunca sabemos quando tudo implodirá. Isso ajuda a manter o clima tenso, onde um único riscar de fósforos pode implodir tudo aos ares.
O filme também conta com um grande trunfo: criar horror à luz do dia. Há muita claridade, sendo diurnas as cenas de maior tensão. Só por esta premissa já vale muito a pena conferir.
Existem várias camadas para interpretar os eventos que ocorrerão. Para os familiarizados em ocultismo, as runas servem de reforço narrativo. Aos que nada conhecem, a experiência não chega a ser prejudicada: o essencial é explicado durante a película. Dá para notar que o filme é resultado de uma extensa pesquisa, com cada detalhe bem pensado.
Além de esteticamente impecável, Midsommar conta com uma trilha sonora potente, fruto da contribuição de Bobby Krlic, conhecido pelo seu nome artístico The Haxan Cloak. Cheio de tons soturnos, toques ritualísticos e instrumentais que embalam muito bem o filme, sua trilha ajuda a construir um clima atemporal e denso.
A conclusão pode parecer previsível para alguns – outros não. Mesmo assim, a carga emocional é absurda, certamente quem vê o filme sairá desnorteado. Um final feliz, dependendo do ponto de vista, tal como um conto de fadas às avessas. São imagens que permanecerão por alguns dias na cabeça, uma mistura entre o belo e o perturbador. Afinal, esta é uma história sobre dor e luto. Às vezes, podemos encontrar afago onde jamais se imagina.
Sinopse
Após uma tragédia pessoal, Dani (Florence Pugh) acompanha o namorado Christian (Jack Reynor) e alguns amigos dele para participar de um festival de verão na Suécia. Mas, ao invés das férias tranquilas, o grupo se depara com situações um tanto perturbadoras. Para ver o trailer no YouTube, clique aqui.